Autor: Pedro Costa
04 jun 2025

Confira a edição de maio de 2025 do Boletim de Jurisprudência, elaborado pelo nosso time de Seguros.

Para manter os clientes e contatos atualizados, a equipe reúne mensalmente os principais casos julgados nos Tribunais.

 

PROCESSO 01

Dados do Processo
STJ, REsp 2.174.212/PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 01/04/2025, DJen 07/04/2025.

Destaque
O beneficiário inimputável que agrava o risco em contrato de seguro não o faz de modo intencional, devendo ser mantido o seu direito à indenização securitária.

Tema
O beneficiário inimputável que agrava o risco em contrato de seguro não o faz de modo intencional, devendo ser mantido o seu direito à indenização securitária.

QUESTÃO CONTROVERTIDA

Cinge-se a controvérsia em decidir se deve ser concedida a indenização securitária ao filho beneficiário que, em declarada incapacidade (surto esquizofrênico), ceifa a vida da genitora segurada. O julgado restou assim ementado:

“DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA. SINISTRO CAUSADO PELO BENEFICIÁRIO INIMPUTÁVEL. VEDAÇÃO AO NON LIQUET. ART. 768 DO CC. AUSÊNCIA DE INTENCIONALIDADE. MANUTENÇÃO DO DIREITO À INDENIZAÇÃO.

I. Hipótese em exame 1. Recurso especial interposto pela seguradora contra acórdão que reformou a sentença de improcedência e concedeu a indenização securitária ao beneficiário inimputável que causou a morte da segurada.

II. Questão em discussão

2. Superada a admissibilidade, o propósito recursal consiste em decidir se deve ser concedida a indenização securitária ao filho beneficiário que, em declarada incapacidade (surto esquizofrênico), ceifa a vida da genitora segurada.

III. Razões de decidir

3. A lacuna legislativa acerca da possível atividade ilícita do beneficiário no momento do sinistro foi preenchida apenas recentemente, por meio do art. 69 da Lei n. 15.040/2024, em vacatio legis até 10/12/2025 (art. 134).

4. Em atenção à vedação ao non liquet, verificado o hiato legislativo à época dos fatos, deve-se decidir o processo de acordo com “a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”, nos termos do art. 4º da Lei Geral de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

5. Por analogia, pode-se utilizar o art. 768 do Código Civil, o qual estabelece que “o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato”. A interpretação teleológica do dispositivo, cuja finalidade é não premiar o sujeito que intencionalmente agrava o risco contratado, permite que a referida norma alcance não apenas o segurado, mas também o beneficiário, impedindo que este manipule o contrato de risco, agravando-o ou concretizando a seu bel-prazer, e, posteriormente, colha os benefícios daquilo que provocou dolosamente.

6. Como consequência, nos contratos de seguro também prévios à Lei n. 15.040/2024, perderá o direito à garantia o beneficiário que agravar consciente e intencionalmente o risco objeto do contrato segurado.

7. Para o Direito Civil, a inimputabilidade é pressuposto da livre manifestação de vontade, tratando-se de elemento prévio à averiguação da intenção (dolo ou culpa) do agente. O sujeito inimputável ou incapaz, quando realiza ato contrário ao direito, não pratica ato jurídico ilícito propriamente dito, mas ato-fato jurídico indenizável, nos termos do art. 928 do Código Civil.

8. Como conclusão, o beneficiário inimputável que agrava factualmente o risco no contrato de seguro não o faz de modo intencional (com dolo), pois é, ontologicamente, incapaz de manifestar vontade civilmente relevante.

9. Afastada a aplicação do art. 768 do Código Civil por analogia, deve ser mantido o acórdão que concedeu a indenização ao beneficiário.

IV. Dispositivo 10. Recurso especial conhecido e não provido.

Dispositivos citados: arts. 762, 766, 768, 769 e 928 do Código Civil e art. 69 da Lei n. 15.040/2024.

 

PROCESSO 02

Dados do Processo
STJ, AgInt no REsp 2161418/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2025, DJen 22/05/2025.

Destaque
A cobertura por invalidez funcional permanente total por doença (IFPD) exige comprovação de incapacidade permanente e total, impossibilitando o segurado de exercer atividades cotidianas de forma autônoma.

Tema
Requisitos para a cobertura por invalidez funcional permanente total por doença (IFPD) no contrato de seguro de vida, tendo restado o entendimento que há a necessidade de comprovação expressa quanto à perda da função autonômica. Inexistindo a comprovação (laudo pericial desfavorável ao segurado), não se fala em invalidez funcional.

QUESTÃO CONTROVERTIDA
Cinge-se a controvérsia acerca das características da incapacidade funcional permanente total por doença (IFPD) para fins de indenização securitária. O julgado restou assim ementado:

“DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. INVALIDEZ FUNCIONAL PERMANENTE TOTAL POR DOENÇA. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA INDEVIDA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

I. Caso em exame
1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que deu provimento ao recurso especial para julgar improcedente o pedido inicial de indenização securitária por invalidez funcional permanente total por doença (IFPD), invertendo os honorários sucumbenciais.

2. A decisão de primeira instância foi mantida pelo Tribunal a quo, que reconheceu a invalidez funcional do segurado com base na perda da função autonômica relacionada à micção, apesar de laudo pericial contrário.

II. Questão em discussão
3. A questão em discussão consiste em saber se a perda da função autonômica relativa à micção, que obriga o uso contínuo de bolsa coletora, caracteriza invalidez funcional permanente total por doença, conforme jurisprudência do STJ.

4. Outra questão é se a decisão monocrática que deu provimento ao recurso especial revolveu questões fáticas e probatórias, esbarrando nos óbices das Súmulas n. 5 e 7 do STJ.

III. Razões de decidir
5. A jurisprudência do STJ estabelece que a cobertura por IFPD exige comprovação de incapacidade permanente e total, impossibilitando o segurado de exercer atividades cotidianas de forma autônoma, o que não foi comprovado no caso.

6. A decisão monocrática não revolveu questões fáticas e probatórias, mas realizou nova valoração jurídica das provas e dos fatos, conforme entendimento do STJ.

IV. Dispositivo e tese
7. Agravo interno desprovido.

Tese de julgamento: “1. A cobertura por invalidez funcional permanente total por doença (IFPD) exige comprovação de incapacidade permanente e total, impossibilitando o segurado de exercer atividades cotidianas de forma autônoma. 2. A decisão monocrática que realiza nova valoração jurídica das provas e dos fatos não esbarra nos óbices das Súmulas n. 5 e 7 do STJ”.

Dispositivos relevantes citados: Circular SUSEP n. 302/2005, art. 17; CPC/2015, art. 1.040.

Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 1.845.943/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, julgado em 13/10/2021; STJ, AgInt no REsp n. 1.948.167/ES, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, julgado em 31/3/2025.”

 

PROCESSO 03

Dados do Processo
STJ, REsp 2087118/MS, Rel. Min. Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 19/05/2025, DJen 22/05/2025.

Destaque
Diante da necessidade de interpretação restritiva das cláusulas do seguro, é inviável a equiparação entre doença profissional e acidente de trabalho, para recebimento de indenização securitária, notadamente quando há exclusão de cobertura da invalidez parcial por doença laboral.

Tema
Análise da possibilidade de adequação da doença profissional à invalidez permanente por acidente por meio do conceito de acidente de trabalho, levando em conta a existência de incapacidade laboral, onde se reiterou a necessidade de interpretação restritiva das cláusulas do seguro. A equiparação foi afastada, tendo o e. STJ entendido que a indenização securitária não é devida nos casos de doença profissional em que há cobertura apenas para IPA, uma vez que não há acidente de trabalho nesses casos.

QUESTÃO CONTROVERTIDA

Cinge-se a controvérsia acerca da equiparação da invalidez permanente por acidente (IPA) ao conceito de acidente de trabalho para fins de indenização securitária. O julgado restou assim ementado:

“RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO EM GRUPO. COBERTURA POR INVALIDEZ PERMANENTE POR ACIDENTE (IPA). INCAPACIDADE LABORAL. EQUIPARAÇÃO A ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. DESCABIMENTO. PRECEDENTES.

1. O Tribunal de origem deu provimento à apelação do autor para determinar o pagamento do seguro coletivo amparado na alegação de que a incapacidade laboral se equipara ao acidente de trabalho, este previsto na cláusula do seguro para pagamento do seguro. O entendimento de origem não encontra amparo na reiterada jurisprudência do STJ, firmada na inviabilidade de interpretação extensiva das cláusulas do seguro.

2. “A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, nos contratos de seguro de vida em grupo, diante da necessidade de interpretação restritiva das cláusulas do seguro, é inviável a equiparação entre doença profissional e acidente de trabalho, para recebimento de indenização securitária, notadamente quando há exclusão de cobertura da invalidez parcial por doença laboral […]” (AgInt no AREsp n. 2.646.012/MS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 16/10/2024).

Recurso especial provido.”

 

PROCESSO 04

Dados do Processo
STJ, AgInt no AREsp 2737619/RJ, Rel. Min. Daniela Teixeira, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/05/2025, DJen 08/05/2025.

Destaque
A jurisprudência do STJ afirma que a correção monetária sobre a indenização securitária incide desde a data da contratação até o efetivo pagamento, ainda que não haja cláusula contratual expressa, pois visa preservar o valor da moeda e da obrigação.

Tema
A indenização securitária deve ser corrigida monetariamente desde a data da contratação, não sendo possível a alegação de dever de informação da empresa estipulante como justificativa para que se aplique entendimento diverso.

EMENTA

Cinge-se a controvérsia acerca da aplicação da correção monetária em contratos de seguro. O julgado restou assim ementado:

“DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA EM GRUPO. CORREÇÃO MONETÁRIA DO CAPITAL SEGURADO. PREVISÃO CONTRATUAL E JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE. PREQUESTIONAMENTO INEXISTENTE. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. REEXAME DE FATOS E CLÁUSULAS CONTRATUAIS. ÓBICES DAS SÚMULAS 5, 7 E 83 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que conheceu parcialmente de recurso especial manejado por seguradora e, nessa extensão, negou-lhe provimento. A controvérsia envolve ação de cobrança de seguro de vida em grupo, proposta por beneficiários pleiteando a atualização monetária do capital segurado com base no IPCA, diante da ausência de comprovação de dissídio coletivo, conforme previsto na proposta de adesão assinada pelo ex-segurado. A seguradora argumenta que não houve atualização por ausência de documentação enviada pela estipulante. O acórdão estadual reconheceu o direito à correção monetária, decisão mantida pelo STJ.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2. Há quatro questões em discussão: (i) definir se há direito à atualização monetária do capital segurado nos contratos de seguro de vida em grupo mesmo na ausência de cláusula expressa ou comprovação de dissídio coletivo; (ii) estabelecer se a tese de ausência de dever de informação da estipulante poderia ser conhecida pelo STJ; (iii) determinar se o recurso especial poderia ser admitido para reexaminar cláusulas contratuais e provas; e (iv) averiguar a ocorrência de prequestionamento suficiente para viabilizar a análise da matéria em recurso especial.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3. A jurisprudência do STJ afirma que a correção monetária sobre a indenização securitária incide desde a data da contratação até o efetivo pagamento, ainda que não haja cláusula contratual expressa, pois visa preservar o valor da moeda e da obrigação.

4. O acórdão recorrido aplica corretamente essa orientação, razão pela qual incide a Súmula 83 do STJ, que impede o conhecimento do recurso especial quando a decisão impugnada está em conformidade com a jurisprudência dominante do Tribunal.

5. A revisão da conclusão do Tribunal de origem sobre a interpretação das cláusulas contratuais demandaria reexame de provas e análise contratual, providências vedadas em sede de recurso especial pelas Súmulas 5 e 7 do STJ.

6. A tese de ausência de dever de informação da estipulante não foi debatida pelo Tribunal de origem, nem sequer de modo implícito, inexistindo, portanto, o necessário prequestionamento, o que atrai os óbices das Súmulas 282 do STF e 211 do STJ.

7. A interposição de embargos de declaração na origem, por si só, não supre a ausência de prequestionamento quando o acórdão recorrido não enfrenta a matéria de forma expressa ou implícita.

IV. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.”