Autor: Bianca Pires
10 jun 2022

Nesta quarta-feira (08), a Segunda Seção do STJ, nos termos do voto do Relator Ministro Luis Felipe Salomão, fixou o entendimento de que o Rol de Procedimentos e Eventos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é taxativo, devendo ser observadas, além das Resoluções do órgão administrativo, as seguintes condições:

  • A operadora não é obrigada a custear procedimento/tratamento fora do rol da ANS, caso exista opção similar e eficaz já incorporada ao rol;
  • Possibilidade de contratação de cobertura ampliada ou aditivo contratual para cobertura extra rol pelo beneficiário;
  • Não havendo substituto terapêutico, ou após esgotados os procedimentos incluídos na lista da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico, desde que: (a) o tratamento/medicamento não tenha sido indeferido expressamente pela ANS quando da incorporação ao rol; (b) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina; (c) haja recomendações de órgãos técnicos, como Conitec e NatJus; e (d) seja realizado, quando possível, o diálogo do magistrado com especialistas, incluindo a comissão responsável por atualizar a lista da ANS, para tratar da ausência desse tratamento no rol de procedimentos.

Em relação a esse último item, a seção citou os enunciados 23, 33 e 97 das Jornadas de Direito em Saúde.

O entendimento foi firmado, por maioria, no julgamento dos EREsp 1.886.929/SP e EREsp 1.889.704/SP. Restaram vencidos os votos da Ministra Nancy Andrighi, instauradora da divergência, seguida pelos Ministros Paulo Sanserino e Moura Ribeiro.

Havia divergências nos precedentes das Terceira e Quarta Turmas quanto ao tema. O entendimento da Terceira Turma era no sentido de que o rol da ANS se reveste de caráter meramente exemplificativo, sendo, portanto, abusiva a negativa da cobertura pelo plano de saúde do tratamento fundamentadamente indicado pelo médico assistente do paciente. Por sua vez, a Quarta Turma, priorizando a segurança jurídica, bem como o equilíbrio econômico-financeiro das relações contratuais, entendia que não haveria, em regra, abusividade na negativa de cobertura de procedimentos e eventos não contemplados no rol pela operadora.

Ao votar, o Ministro Relator falou sobre a segurança das relações jurídicas e afirmou que o Judiciário possui um papel fundamental de promover uma interpretação justa e equilibrada da legislação, “sem sentimentalismos e ideias preconcebidas”. Seus argumentos foram fundamentalmente pautados na defesa da legislação que rege o setor suplementar, na legitimidade da ANS como reguladora, no equilíbrio econômico contratual e na comprovação científica dos tratamentos de cobertura obrigatória. Além disso, destacou a Lei n° 14.307/2022, que, além de diminuir o prazo para atualização da lista, determina que as tecnologias aprovadas pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) sejam automaticamente incorporadas ao rol.

Essa nova periodicidade para a atualização do rol, prevista na Lei 14.307/2022 e regulamentada pela Resolução Normativa ANS n.º 470/2021, foi, em verdade, questão de grande destaque na discussão.  O referido prazo de atualização foi recentemente reduzido de dois anos para seis meses, de modo que os beneficiários não terão que aguardar mais tanto tempo pela análise técnica da inclusão de procedimentos no rol de cobertura obrigatória, além de fixar um prazo razoável para as operadoras se organizarem, respeitando o equilíbrio econômico-financeiro.

Destaca-se o apontamento do Ministro Villas Bôas Cueva no sentido de que essa posição não deve ser absoluta, sobretudo porque a atividade administrativa regulatória é sujeita ao controle do Judiciário, “a quem compete combater eventuais abusos, arbitrariedades e ilegalidades no setor”.

Frisa-se que o julgamento não ocorreu em sede de repetitivos, de modo em que a decisão não possui repercussão geral. De qualquer forma, o assunto restará pacificado entre as Terceiras e Quarta Turmas, ao passo que a recente decisão abrirá discussão para possível tese de repercussão geral.

Os votos e o acórdão ainda não foram disponibilizados no portal oficial do Superior Tribunal de Justiça.