A ação judicial a ser proposta pelo credor-fiduciário após a concretização da consolidação da propriedade em seu nome ainda é tema controvertido na doutrina e na jurisprudência, quando o imóvel se encontra ocupado por terceiro locatário.

Com a constituição da alienação fiduciária, opera-se o desdobramento da posse, transmitindo-se ao credor-fiduciário a posse indireta, enquanto a posse direta permanece com o devedor-fiduciante. Em razão disso, assegura-se ao devedor-fiduciante os direitos inerentes ao exercício da posse direta, dentre os quais, o de pactuar com terceiro contrato de locação do imóvel, salvo previsão contratual em sentido contrário.

Vencida e não paga a dívida que deu origem à alienação fiduciária, mesmo após devidamente intimado para proceder à purga da mora nos termos previstos na Lei 9.514/97, a propriedade do imóvel consolidar-se-á em favor do credor-fiduciário que passará a ser o proprietário pleno do imóvel, caso este não venha a ser arrematado por ocasião do público leilão.

Segundo dispõe o §7º do art. 27 da Lei 9.514/97, estando o imóvel locado, no prazo de 90 (noventa) dias contados da consolidação da propriedade, a locação poderá ser denunciada com fixação do prazo de 30 (trinta) dias para que o locatário promova a desocupação do imóvel. Tal denúncia somente poderá ser evitada se o credor-fiduciário tiver anuído, por escrito, com a celebração da locação originalmente firmada com o devedor-fiduciante.
Caso o imóvel não venha a ser desocupado, o credor-fiduciário, agora proprietário pleno do imóvel, tomará as medidas cabíveis para desocupar o imóvel locado por terceiro; pergunta-se, deveria ajuizar ação de reintegração de posse com base no art. 30 da Lei 9.514/97 ou com base na Lei de Locações?
O art. 30 da Lei 9.514/97 assegura ao credor-fiduciário, ao seu cessionário ou sucessores, incluindo-se, aí eventual arrematante do imóvel no leilão realizado, a reintegração de posse do imóvel, com liminar para a desocupação do imóvel em 60 (sessenta) dias.
Silencia-se a Lei 9.514/97, porém, em relação à medida a ser adotada pelo credor-fiduciário ou terceiro arrematante, para a obtenção da posse exercida por terceiro locatário, fixando a referida Lei, como visto, apenas o prazo para a realização da denúncia da locação (art. 27, §7º).
O tema é polêmico, havendo divergências acerca da medida correta para a retomada do imóvel ocupado por locatário não só na doutrina como também na jurisprudência.
Melhim Namem Chalhub¹, no seu livro sobre o tema, defende a ação de despejo como a adequada para a desocupação do imóvel, concluindo que a reintegração só tem lugar diante do devedor-fiduciante.
A ação de reintegração de posse, como se sabe, é cabível quando há exercício ilegítimo da posse. Não nos parece acertado concluir que a posse exercida pelo locatário detentor de contrato firmado com o devedor-fiduciante seria ilegítima.
Aliás, se a locação não for denunciada, prosseguirá regularmente, sub rogando-se o credor-fiduciário ou o terceiro arrematante na figura do locador.
Por outro lado, ocorrendo a denúncia, e tendo o locatário descumprido o prazo de desocupação de 30 (trinta) dias, caberá ao credor-fiduciário ou arrematante ajuizar ação de despejo, com fundamento no art. 27, §7º da Lei 9.514/97 c/c a disposição do art. 7º da Lei 8.245/91.
A esse respeito, importa ressaltar que na ação de despejo, a desocupação do imóvel ocorrerá somente após o trânsito em julgado da ação, ao passo que, como visto, a reintegração de posse possui previsão expressa de liminar para a desocupação em 60 (sessenta) dias.
Apesar disso, cumpre destacar que, mesmo com a denúncia da locação realizada pelo credor-fiduciário ou arrematante, e consequente propositura da ação de despejo, enquanto o locatário permanecer no imóvel ficará obrigado a pagar o valor do aluguel e encargos da locação ao atual proprietário.
Embora a liminar de desocupação na ação de despejo não seja a regra, o time de Direito Imobiliário do Villemor logrou êxito em obter liminar estabelecendo a desocupação voluntária do locatário em 15 dias, sob pena de expedição de mandado de despejo forçado, em ação de despejo proposta pelo credor-fiduciário, em razão da inadimplência do locatário e da inexistência de qualquer garantia prevista no contrato, o que viabilizou a aplicação do art. 59, §1º, inciso IX da Lei 8.245/91, que estabelece a concessão de liminar nessa hipótese. A decisão foi proferida nos autos do processo nº 0216860-18.2021.8.06.0001, em trâmite perante a 34ª Vara Cível do Foro da Comarca de Fortaleza/CE.
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¹CHALHUB, Melhim Namem. Alienação fiduciária: Negócio fiduciário. – 7. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2021, pág. 401/403
 
 

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